Advogado de Júri

Advogado de Júri
1 ano atrás

grande inspiração da maioria dos estudantes de Direito é a de, advogados, subirem à Tribuna de defesa no Tribunal do Júri, e, vestidos de beca, produzirem oração cativante, emocionada e persuasiva aos jurados.

Há uma generalizada impressão no seio do povo, de que o bom advogado é aquele que atua no Tribunal Popular, ou, pelo menos, advogado de qualidade, advogado mesmo… Não é bem assim, pois em todos os ramos do Direito há notáveis e maus advogados.

Na verdade, a auréola que cerca o advogado do Júri provém do sistema de oralidade que preside o processo no Tribunal do Júri, onde tudo é verbal, seja da parte da acusação pública ou particular, seja dos defensores e até mesmo do juiz-presidente.

E, depois da palavra do promotor e do advogado de defesa, novamente, a palavra com a réplica e a tréplica. A solenidade do Tribunal, as togas e becas que requintam o ambiente, as orações grandiloquentes e dramáticas, as fisionomias circunspectas, o silêncio e a gravidade dos comportamentos, a presença inerme e passiva do réu exposto, o fetichismo dos sete jurados e a presença do povo na assistência, atento e ordeiro.

Toda a mise-em-scéne encanta e atrai o povo, seja como espetáculo dinâmico, seja como palco de teses e antíteses, que se porfiam e produzem a concorrência do talento, da cultura, da sagacidade e da inteligência. É a sessão do Júri, na sua inteireza, um espetáculo verbal rico e emocionante. Não há cidadão normal e de boa fé que não seja atraído a assisti-la.

É bem por isso que Manoel Pedro Pimentel comparou o Tribunal do Júri ao teatro, onde o advogado deve ser, necessariamente, o autor da versão da defesa, o diretor da interpretação e o ator que apresenta o trabalho.

O advogado é quem cria a versão da defesa, fazendo o enquadramento dos fatos na tese jurídica, ou seja, construindo e criando o roteiro e a tese a ser desenvolvida no plenário.

O advogado é aí o autor. Mas não basta. É preciso que enuncie a correta exposição da tese, que saiba dar e responder apartes, os gestos, a voz, as expressões que devem ser, um a um, estudados e observados. Aí, o advogado cumpre o papel de diretor. E, finalmente, a exposição oral da defesa, o recitativo, as modulações da voz, a simpatia da personagem, a dramaticidade, a eloquência que exigem do advogado o comportamento de um ator em cena, trabalhando perante o seu auditório, constituindo de sete jurados. Aí o advogado é ator.

Resulta de tudo, escreve Manoel Pedro Pimentel, que o advogado é autor, diretor e ator de um monólogo, porque os jurados colocados à sua frente são sete homens [e mulheres] em posição hierática, impenetrável, enigmática, que oscilarão, qual pêndulo, entre as argumentações da acusação e da defesa. É bem por isso que o jurista proclamou que um julgamento feito pelo Tribunal do Júri, ao contrário do que muitos pensam, não é uma loteria.

Depende, é certo, de algumas peripécias, mas pode ser o seguro resultado de uma conduta bem planejada e executada com rigor, desde a fase do inquérito policial até o plenário do júri. O júri não é uma aventura a que se atrevam os que se distinguem somente pela audácia e pela sede de fama.

É tarefa reservada aos mais aptos, aos mais preparados e conscientes, que tenham as qualidades mínimas necessárias à magnitude da empresa, e que não ponham em risco a liberdade do réu, tão somente para a satisfação de vaidades mal disfarçadas.

Só o advogado com largo tirocínio, cultura jurídica, experiência razoável e grande sensibilidade pode transformar-se em grande advogado do Tribunal do Júri. Evaristo de Moraes escreveu que o eminente Enrico Ferri sempre ensinou aos seus alunos ser imprescindível não se fiar o advogado na improvisação quanto ao fundo, somente lhe confiando a forma.

Conhecimento seguro dos elementos da causa e ideias gerais de Psicologia e de Sociologia devem constituir o preparo de qualquer luta forense.

Relatou Roberto Lyra que a eloquência sempre foi um extraordinário elemento de conquista e domínio, e a perda de prestígio não foi do verbo, mas do verbalismo.

O efeito das palavras escritas ou faladas se produz em todos os Tribunais e não somente no Júri. Contudo, uma advertência se impõe: acusadores e defensores só terão a perder com divagações impertinentes, hipérboles vazias, embustes patéticos ou gaiatos. “Serão, pelo menos, ineptos. E não hão de atribuir suas culpas ao Júri.”

(Da obra “Grandes advogados, grandes julgamentos no Júri e noutros Tribunais”, de Pedro Paulo Filho)